terça-feira, 31 de agosto de 2010

O grande dia


Tinha chegado finalmente o dia pelo qual o João e a Teresa tanto tinham esperado. Para trás ficavam meses de burocracias – quem haveria de dizer que preparar um casamento dava tanto trabalho??? – dúvidas de última hora, angústias várias e incertezas diversas.

Estava tudo pronto. Os convidados já há muito tinham confirmado a sua presença – protocolo assim o obriga – os pais estavam felizes, a lua-de-mel marcada para aquele sítio paradisíaco que qualquer casal que se preze gosta de ir. No final de contas, supostamente, só nos casamos uma vez e o dia tem de ser memorável…

A noite anterior foi um stress. Sem o saberem, João e Teresa tinham feito praticamente a mesma coisa. A última conversa de solteiros com os respectivos pais, a comida que custou a passar no jantar de “despedida” da casa onde sempre viveram… e os passos dados pelas várias divisões… carícias feitas aos móveis e aos objectos que tantas recordações traziam. Aquela racha na parede feita à socapa quando o João tinha 7 anos e achou que a casa tinham um tesouro escondido…o urso de peluche a dizer “I Love You”, dado por um antigo namorado que a Teresa nunca se conseguiu desfazer…

A casa parecia vazia. Roupas, livros, fotografias, cd´s, e um manancial de coisas que conseguimos acumular ao longo de uma vida de solteiro já tinham ido há muito para aquela que seria a nova casa de ambos. João e Teresa sentiam-se como se estivessem num hotel, a dormir a última noite do fim das suas vidas.

Teresa respirou fundo e preparou-se para se deitar. As memórias dos últimos meses eram mais que muitas, a ansiedade do dia que se avizinhava também e o sono teimava em não vir. Lembrou-se da forma original como João lhe pediu em casamento. Um jantar romântico num sítio way over their budget parecia indiciar que aquilo que Teresa há muito ansiava estava iminente.

Mas o jantar passou e João, embora aparentemente nervoso com algo, não abria a boca. A surpresa estava reservada para a sobremesa. No bolo de chocolate que Teresa pediu, um anel de noivado estava escondido. Teresa estava tão absorvida com a conversa que quase partiu um dente ao trincar aquele que seria o símbolo transitório do compromisso entre ambos, enquanto a verdadeira aliança de casamento não era colocada no seu dedo.

Teresa sorriu. Os meses que se seguiram foram um virote. Escolher o local da cerimónia, seleccionar os convidados – aqueles não, que são uns chatos e já não lhes falamos há anos!!! …. – pensar na ementa. Pedir ao Rodrigo que pinta tão bem, que faça os convites personalizados. Ah, e falar com a família Pereira da Silva, que tem aqueles 20 filhos e primos que cantam e tocam maravilhosamente.

O vestido! Foi das coisas mais difíceis. Escolher entre a loja e o estilista. Experimentar dezenas (não terá sido uma centena?), “são todos feios, que horror onde foram buscar este decote”....

Até ao dia em que Teresa vestiu o “seu” vestido. Bastou experimentá-lo uma vez e soube logo que era aquele. O drama foram os sucessivos arranjos, porque ou Teresa emagrecia com o stress ou alargava um bocadinho. E mesmo quando a mãe lhe dizia, “não te preocupes que está óptimo”, Teresa fazia birra de noiva e pedia para o arranjar. No final de contas, no dia do nosso casamento, mais do que o noivo, a noiva tem de estar perfeita… deslumbrante!!!

E assim foi, os dias foram passando, os problemas foram sendo resolvidos à medida que apareciam – sim, porque há imensas coisas com as quais os noivos não contam nem estão à espera e, de repente, pumba, lá vem mais uma questão para resolver – e chegaram à véspera do casamento com tudo resolvido, menos a ansiedade.

O dia seguinte amanheceu radioso. Não foi por acaso, foi mesmo por escolha de calendário. Casar em Maio, mês de Maria, alarga as possibilidades de ter um dia excelente, com uma luz para as fotografias que nos façam, passados muitos anos, recordar o casamento com imensa saudade.

Teresa chegou atrasada à Igreja 15 minutos, como convém a qualquer noiva. E João estava à espera no Altar com aquele ar misto de parvo e apaixonado que, no fundo, quer apenas dizer uma coisa: “esta é mesmo a mulher da minha vida”.

A cerimónia foi bonita, o copo de água também e todos se divertiram. Alguns choros, claro, de comoção, muitos risos e sorrisos e muita, mas mesmo muita alegria.

À noite, antes de se deitarem naquela que antecede o seu primeiro acordar enquanto marido e mulher, Teresa há-de dizer a João que o dia passou muito depressa, tendo em conta todo o trabalho que tiveram. “Não faz mal”, dir-lhe-á ele certamente, “temos o resto das nossas vidas para vivermos com calma”. E deitar-se-ão, abraçados, juntos, sentindo o calor dos seus corpos, mas também o calor de um amor que, desde aquele dia os transformou num só.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

A falácia minoritária*


Desde que o PS ganhou as eleições, o País parece estar em suspenso à espera que o Governo provoque a sua própria queda, que a Oposição lance uma moção de censura, ou que o Presidente da República considere que o Governo já não serve os interesses do País. Nada mais errado.

Se é verdade que, para a maioria dos Portugueses, o acto eleitoral de Outubro constituiu o fim de um sonho, tal não quer dizer que, nas próximas eleições, ir-se-á corrigir uma situação que, para os olhos de muitos, é irreal. E engana-se quem pensa que esta é a melhor opção: a ameaça de eleições antecipadas, agrada, para já, ao Governo - pode vitimizar-se e apostar na comunicação e no marketing. E, pelo caminho, não faz aquilo para o qual foi eleito: governar.

Este ano é, portanto, propício aos melhores cenários catastrofistas. O Executivo escuda-se que a Oposição não o deixa governar e esta parece alheada da sua real função. Pelo meio, vão sendo lançados fait divers – como a questão do casamento homossexual – que alegram as hostes, entretêm os media, sossegam a maralha e nos afastam, enquanto País, das nossas prioridades.

Nesse sentido, é essencial que o Governo não se escude no argumento que não consegue cumprir o seu programa à custa da Oposição. Parece que só agora é que descobriram que é difícil governar sem maioria, esquecendo-se que Guterres o fez durante 6 anos, tendo saído apenas por vontade própria. E até mesmo Cavaco Silva aprovou várias leis no seu primeiro governo minoritário, caindo apenas devido a uma moção de censura do PRD.

A História não se repete. E, em Política, muito menos. Convinha, por isso, a cada um dos actores da cena Política Nacional, fazer o que deles se espera. Ao Governo, encontrar consensos e governar; à Oposição, fazer o seu caminho de forma construtiva, apoiando quando deve fazê-lo e criticando quando é necessário. Para garante das instituições, temos o Chefe de Estado que saberá, melhor do que muitos, quais os passos que pode dar.

Querer desencadear eleições apenas porque sim é um erro que se pagará caro. O PSD, enquanto maior partido da oposição tem responsabilidades acrescidas nesta matéria e deve apresentar-se ao eleitorado como a alternativa responsável de Poder. Infelizmente, o mesmo não pensaram a maioria dos eleitores em Outubro último e o resultado está à vista. Possa também o PSD aprender com o passado e não cair na tentação da falácia minoritária. Em Política, como na vida, os erros pagam-se caro.
*Artigo de opinião publicado no site do Instituto Francisco Sá Carneiro. Também disponível aqui: